Introdução

Paulo Anglada citando Peter Y. De Jong nos lembra que embora tenhamos uma concepção elevada da pregação, a fé reformada não atribui à palavra pregada eficácia automática, mecânica ou mágica1 e nem a associa primordialmente às habilidades e capacidades pessoais do pregador. Segundo a teologia reformada, a eficácia da pregação depende fundamentalmente da operação do Espírito Santo e da responsabilidade humana do pregador e dos ouvintes.

A Eficácia da Pregação Reformada

Robert L. Dabney assevera que no entendimento reformado, a eficácia da pregação depende fundamentalmente da obra do Espírito,2 que ocorre em três momentos: na preparação do sermão, na entrega da mensagem e na recepção da mensagem quando pregada.

Com relação ao pregador, a eficácia da pregação depende da capacitação do Espírito para a tarefa (2 Co 3.5-6). É o Espírito Santo quem confere poder à pregação (1 Co 2.4-5 e 1 Ts 1.5). João Calvino escreveu que “… nenhum mortal está por si mesmo qualificado para a pregação do evangelho, a não ser que Deus o revista com o seu Espírito”.3

A eficácia da pregação depende da ação iluminadora do Espírito Santo na preparação do sermão e da unção do Espírito na entrega da mensagem. Na preparação, a escolha do texto ou do livro a ser exposto e a determinação da sua extensão; a compreensão do seu propósito, sentido, argumentação, significado e aplicação; e a elaboração da mensagem; tudo depende especialmente da operação interna do Espírito Santo na mente e no coração do pregador.

Se o Espírito Santo não assistir o pregador no seu labor exegético, o resultado do seu trabalho será insuficiente, por maior que seja o seu conhecimento e por mais diligente que seja no seu trabalho. Na entrega da mensagem, a eficácia varia na proporção da dependência do pregador da assistência do Espírito, e não da confiança no seu preparo ou habilidades naturais. Havendo se empenhado para compreender o texto e preparar a mensagem e suplicado pela iluminação do Espírito, no momento da pregação o pregador precisa confiar-se completamente à assistência do Espírito Santo, dando lugar a que ele intervenha na entrega da mensagem.

Com relação ao ouvinte, a eficácia da pregação depende, em última instância, da ação iluminadora interna do Espírito Santo na sua mente e coração. É ele quem abre o coração dos ouvintes para que compreendam a mensagem (At 16.14). É ele quem escreve a mensagem no coração dos ouvintes (2 Co 3.3). Somente ele faz resplandecer o evangelho no coração, “para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo” (2 Co 4.6). A pregação em si mesma, por mais verdadeira que seja, e por mais ungido que seja o pregador, é inútil. Não porque falte poder a ela. Mas, por causa da cegueira espiritual do homem natural, a palavra pregada só se torna eficaz pela operação interna imprescindível do Espírito Santo, “… o Mestre Interior”, que a acompanha.4

A Confissão de Fé de Westminster afirma que é pelo ministério (da Palavra), tornado eficiente pela presença de Cristo e pelo seu Espírito, que os santos são congregados e aperfeiçoados nesta vida.5 O Catecismo Maior de Westminster reconhece que é o Espírito Santo quem torna a pregação da Palavra o meio especialmente eficaz para a salvação:

O Espírito de Deus torna a leitura, e especialmente a pregação da Palavra, um meio eficaz para iluminar, convencer e humilhar os pecadores; para lhes tirar toda confiança em si mesmos e os atrair a Cristo; para os conformar à sua imagem e os sujeitar à sua vontade; para os fortalecer contra as tentações e corrupções; para os edificar na graça e estabelecer os seus corações em santidade e conforto mediante a fé para a salvação.6

Conclusão

O Espírito Santo usa nossas palavras, mas é o trabalho dele e não o nosso que produz efeito no íntimo oculto da vontade humana. Paulo escreveu: “Deus… resplandeceu em nosso coração para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Cristo. Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós” (2 Co 4.6, 7). A glória da pregação é que Deus realiza sua vontade por intermédio dela, mas somos sempre humilhados e ocasionalmente confortados com o conhecimento de que ele age além das nossas limitações humanas.

Trecho da palestra “A Reforma e o Resgate da Pregação da Palavra”, proferida no ACAMPFAMILIA 2017 pelo Pr. Alan Kleber
_____________________
Fonte:
1Peter Y. De Jong em Paulo Anglada, Vox Dei: A Teologia Reformada da Pregação em “Fides Reformata”,Vol 4, nº 1, 1999, 156.
2Robert L. Dabney, Sacred Rhetoric: A Course o Lectures on Preaching, (Edimburgo e Pensilvânia: Banner of Truth, 1979), 36.
3João Calvino em Paulo Anglada, Vox Dei, 157.
4Calvino, Institucíon de la Religión Cristiana, 5a ed., II.ii, Rijswijk-Países Bajos:Felire, 1999, 20.
5Confissão de Fé de Westminster, XXV.III.
6Catecismo Maior de Westminster, resposta 155.