“Ó Deus, quebra-lhes os dentes na boca; arranca, SENHOR, os queixais aos leõezinhos. Desapareçam como águas que se escoam; ao dispararem flechas, fiquem elas embotadas. Sejam como a lesma, que passa diluindo-se; como o aborto de mulher, não vejam nunca o sol. Como espinheiros, antes que vossas panelas sintam deles o calor, tanto os verdes como os que estão em brasa serão arrebatados como por um redemoinho. Alegrar-se-á o justo quando vir a vingança; banhará os pés no sangue do ímpio. Então, se dirá: Na verdade, há recompensa para o justo; há um Deus, com efeito, que julga na terra” (Salmo 58.6-10)
Muitos desses belos poemas hebraicos são obviamente cânticos/orações, e não parece natural para a maioria de nós simplesmente lê-los (e muito menos cantá-los!) como se estivéssemos ouvindo a conversa de alguém com Deus. Em tempos de alegria, profunda tristeza ou confusão, não tomamos frequentemente os Salmos fazendo deles sua oração? Mas então, com o coração totalmente consagrado, nos deparamos com aquelas frases que parecem tão chocantes – tão diametralmente opostas – a tudo que aprendemos um dia sobre o amor e a tolerância cristã.
Como devemos entender uma oração da Escritura que diz: “Ó Deus, quebra-lhes os dentes na boca” (Sl 58.6) ou “A morte os assalte, e vivos desçam à cova!” (Sl 55.15)? Realmente, essa é uma linguagem forte!
Quem nunca se perguntou se os hinos/orações, “Envergonhem-se e sejam sobremodo perturbados todos os meus inimigos; retirem-se, de súbito, cobertos de vexame… perturbem-se e pereçam” (Sl 6.10; 83.17) não são uma expressão de vingança pecaminosa da parte dos salmistas, como dizem alguns pastores e teólogos? Será que que eles não são culpados de expressar sentimentos mundanos de vingança como aqueles que assistimos nos telejornais ou são postados nas redes sociais? É possível acreditar que os salmistas estão se entregando a tais sentimentos rancorosos?
“Davi observou os mesmos princípios em seu tempo assim como Paulo o fez mais tarde. O ungido do Senhor do Antigo Testamento e o apóstolo de Cristo no Novo Testamento estão em completa harmonia. A regra para ambos é bem declarada por Davi, o autor da grande maioria dos salmos de imprecação. 1 Samuel 24.12 registra suas palavras ao seu inimigo mortal, que estava caçando Davi para matá-lo (veja v. 11): “O SENHOR julgue entre mim e ti. Vingue ele os males que tens feito contra mim, mas não levantarei a mão contra ti”.
“A vingança pertence ao Senhor é a regra para todos os tempos. Então, de onde tiramos a ideia de que é errado pedir para Deus trazer julgamento sobre os ímpios? Esta mentalidade se infiltrou no nosso meio tão sutilmente que se tornou uma ideia muito comum em nossos dias. Você pode até mesmo ouvir um cristão amigo expressar um intenso amor pelos amigos ou parentes, que o julgamento de Deus contra os seus feitos maus é rejeitado. É possível perceber tal profundo sentimento de amor por outro, como próprio “cristão”, enquanto falhar em perceber o que está sendo expresso realmente evidencia uma falta de amor por Deus. Em adição, tais ideias demonstram uma compreensão tristemente inadequada da seriedade do pecado do homem contra um Deus santo” (James E. Adams, War Psalms of the Prince of Peace[Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1991], p. 46-47).
Muitos cristãos sinceros passam por essas expressões como se protegessem seus rostos do calor do ódio, correndo rapidamente para outras seções onde encontram uma linguagem mais confortável (Há tantas frases tranquilizantes nos Salmos!). Mas isso pode ser uma resposta adequada a qualquer parte da Palavra de Deus? Ou é apenas uma desculpa?
Nós que aceitamos as Escrituras como a única regra de fé e prática, como lidamos com essas questões? Nós que somos chamados a lidar corretamente com a Palavra da Verdade, procuramos apreender as verdades ensinadas nos Salmos Imprecatórios a fim de repartir este pão espiritual para o povo de Deus?
O problema é maior do que muitos imaginam! Quanto mais cuidadosamente olhamos para os Salmos, mais vemos que as orações por vingança não são um punhado de comentários colaterais. Eles não são encontrados em apenas alguns lugares isolados para que possamos ignorá-los e decidir que talvez não valha a pena tentar entendê-los. Eles permeiam o Saltério! Então, começamos a reconhecer que outras partes do Antigo Testamento expressam ideias semelhantes. Nós até as encontramos reafirmadas por nosso Senhor Jesus e seus apóstolos no Novo Testamento!
“Olhe para o salmista. Veja alguns desses salmos imprecatórios. O que eles são? Não há nada de errado com eles. É apenas o zelo do salmista. Ele está triste e incomodado porque essas pessoas não estão honrando a Deus como deveriam ser. Essa é a sua suprema preocupação” (David Martyn Lloyd-Jones, Sermon on evangelism delivered in Carlisle, PA, 1969 in James E. Adams, War Psalms of the Prince of Peace, p. 9).
Pr. Alan Kleber