Esta realmente é uma questão crítica para com os Salmos Imprecatórios. Quem nas Escrituras ora imprecações para Deus destruir os seus Inimigos? Se você pedisse ao Senhor para destruir seu inimigo pessoal, isso seria em essência amaldiçoar este inimigo e, portanto, configuraria algo pecaminoso. Mas, se o Príncipe da Paz é aquele que pede a Deus para destruir seus inimigos, a questão então muda radicalmente! (cf. Sl 101 e 18).
Portanto, quando alguns perguntam: “Os Salmos são apenas um registro das orações e cânticos carregados de emoção de pessoas que viveram há milhares de anos?”, notamos como essa consideração é contrária a toda a verdade da Escritura. Certamente, os Salmos são de muito maior grandeza e valor do que isso. Mas de quem são essas orações e cânticos, de fato?
Eles não são nossas Próprias Orações
Você já tomou as palavras de um Salmo e fez delas sua oração, e de repente se viu incapaz de continuar orando? De fato, por vezes as palavras dos Salmos nos impedem de chegar até o final!
Por exemplo, como posso clamar diante de Deus: “… Retribuiu-me o SENHOR, segundo a minha justiça”? (Sl 18:20). O salmista continua dizendo:
“… recompensou-me conforme a pureza das minhas mãos. Pois tenho guardado os caminhos do SENHOR e não me apartei perversamente do meu Deus. Porque todos os seus juízos me estão presentes, e não afastei de mim os seus preceitos. Também fui íntegro para com ele e me guardei da iniquidade. Daí retribuir-me o SENHOR, segundo a minha justiça, conforme a pureza das minhas mãos, na sua presença” (Sl 18.20-24).
Estas palavras não podem ser minhas ou de quem eu conheço. Se já nos sentimos incomodados lendo essas palavras em voz alta, quanto mais fazendo-as nossa oração ao Senhor, que conhece a pecaminosidade de nossos corações!
De fato, é difícil entender como Davi pôde orar assim. Algumas pessoas perguntam: “Mesmo que Davi tenha escrito este salmo antes de seu ‘grande pecado’ com Bate-Seba, ele não poderia ter sido tão justo, poderia?”. Sim, isso é verdade! Mas, é preciso lembrar que o Rei Davi admitiu ser um pecador desde seu nascimento (Sl 51.5), assim como todos que nascem em Adão. Outros questionam: “Davi não reconheceu seu pecado? Como porém, esses Salmos soam como as palavras de um homem perfeito?”. Este fato salta da página para nós quando lemos o Salmo 51.
Tomemos por exemplo as palavras da paixão e crucificação de Cristo encontradas no Salmo 22:
“Cães me cercam; uma súcia de malfeitores me rodeia; traspassaram-me as mãos e os pés. Posso contar todos os meus ossos; eles me estão olhando e encarando em mim. Repartem entre si as minhas vestes e sobre a minha túnica deitam sortes” (vv. 16-18).
Você já se perguntou como Davi escreveu isso? Nunca nos é dito que ele experimentou alguma dessas coisas, embora tivesse muitas outras dificuldades. Sabemos, pelo Novo Testamento, que o Senhor Jesus fez suas essas palavras durante o seu sofrimento aqui na terra. Mas em que sentido Davi poderia escrevê-los?
Da mesma forma, quando nossas mentes funcionam bem e nossos corações sentem o peso do próprio pecado, pedir a Deus que destrua nossos perversos inimigos assim como o salmista, nos faz vacilar. Quanto mais lemos e meditamos sobre esses belíssimos Salmos, concluímos: nós também somos maus! Como podemos usar essa linguagem como se fosse nossa? Podemos pedir a Deus que nossos inimigos pessoais tenham seus olhos obscurecidos “…para que não vejam; e faze que sempre lhes vacile o dorso”? (Sl 69:23). Deveríamos nos encarregar de pedir a Deus: “Derrama sobre eles a tua indignação, e que o ardor da tua ira os alcance”? (Sl 69:24).
Devemos ter cuidado para não fazer dos Salmos Imprecatórios nossas próprias orações conforme o nosso estado de espírito sempre em mudança. Contudo, esses Salmos não podem ser usados seletivamente por nós conforme as nossas emoções ou de acordo com os nossos caprichos. Eles são obviamente uma parte central da Palavra de Deus e, como tal, merecem cuidadosa atenção. Devemos chegar a entendê-los como Cristo e Seus apóstolos os entenderam.
Os Salmos na Vida de Nosso Senhor Jesus Cristo
Vejamos os Salmos nos Seus lábios: “Nas tuas mãos, entrego o meu espírito” (Sl 31.5); “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Sl 22.1). Em Suas palavras de angústia, ecoam os Salmos 69.21 e 22.15: “Tenho sede!” (João 19:28). Em seu grito de triunfo: “Está consumado!” (João 19:30), lembramos do Salmo 22.31 (“foi ele quem o fez”; a tradução Septuaginta do Salmo 22 usa o mesmo verbo que Jesus usou). Em sua morte Jesus citou os Salmos, não como alguma autoridade antiga que Ele adaptou para seu próprio uso, mas como Suas próprias palavras – as palavras do Ungido do Senhor que, como o Filho de Davi, Ele realmente era.
Quando olhamos com diligência, descobrimos que o uso dos Salmos pelo Senhor Jesus Cristo como Suas próprias palavras não era peculiar ao Seu tempo de sofrimento na cruz. Ao longo de Seu ministério Ele fez as palavras dos Salmos Suas. Jesus prediz o que Ele dirá como o Juiz no último dia quando cita as palavras do Salmo 6.8: “Então lhes direi claramente: Apartai-vos de mim, todos os que praticais a iniqüidade” (cf. Mt 7.23). Ele fala as palavras do Salmo 35.19 e 69.4 como se referindo diretamente a si mesmo: “Odiaram-me sem motivo” (João 15.25). (Para outras referências, compare com Mt 21.9 com Sl 118.26; Jo 13.18 com Sl. 41.9; Mt 16.27 com Sl 62.12).
Nós não nos aproximamos dos Salmos sem luz ou ajuda. Pelo contrário, temos todos os escritos do Novo Testamento para nos ajudar a entendê-los. O Saltério ocupou um lugar enorme na vida de nosso Senhor. Ele usou como seu livro de orações na sinagoga judaica durante toda a sua vida. Foi o seu livro de canções em todos os festivais do templo. Ele cantou depois da Última Ceia.
Será que Jesus usou simplesmente o livro dos Salmos como outros judeus de Sua época? Temos observado o relacionamento pessoal do Senhor Jesus com os Salmos? Ele citou o Saltério não apenas como profecia; Ele realmente falou os Salmos como Suas próprias palavras!
Pr. Alan Kleber
Traduzido e adaptado da Obra de James E Adams: “War Psalms of the Prince of Peace – Lessons from the Imprecatory Psalms” (P&R Publishing: 2016).